O Showmetech recebeu gentilmente uma cópia cedida pelo Hype.Games, a plataforma digital da Level Up Games, para a elaboração deste review.
O paralelo perfeito
Death Stranding é uma obra com inúmeras camadas e é difícil começar a falar sobre algo tão grande e complexo quanto este game. Nosso propósito como jogadores pode parecer extremamente simples, o de “reconstruir a América”, devastada após um evento de proporções inimagináveis que dá nome ao jogo, e nessa árdua e exaustiva jornada controlamos o cético Sam Porter Bridges, interpretado pelo magnífico Norman Reedeus. O primeiro título da Kojima Productions goza de uma liberdade vibrante e esteticamente fascinante. A Sony, ao publicar e arcar com esse projeto, deu carta branca para que Kojima pudesse tornar Death Stranding, além de uma experiência mirabolante, um game sobre conexões, esperança e o futuro da humanidade, mas não somente isso, é também um game sobre atitudes e pequenos gestos, que de uma forma ou outra, criam laços entre as pessoas. Voltando a trama, Sam atua como uma espécie de entregador, já que as pessoas sobreviventes ao Death Stranding vivem reclusas em cidades com medo da chuva temporal, que possui a característica de envelhecer qualquer coisa que entra em contato, desde seres humanos a suas próprias cargas. Com esse fenômeno, há também a aparição das EPs, entidades sobrenaturais que transitam entre o plano dos vivos e mortos e serão um de nossos principais obstáculos. Nosso protagonista aceita uma missão um tanto quanto ousada da até então presidente do que restou dos Estados Unidos, ou melhor dizendo, Cidades Unidas da América. A pedido de Bridget Strand (Lindsay Wagner), mãe de criação de Sam, devemos atravessar todo o país para reconectar a rede entre as cidades e salvar sua filha Amelie (Emilie O’ Brian), que acabou sendo sequestrada por um grupo paramilitar comandado pelo incansável Higgs, interpretado de forma homérica por Troy Baker. Nessa epopeia entre realidades, Death Stranding se destaca a apresentar personagens coadjuvantes bem desenvolvidos e muito carismáticos, como a nada frágil Fragile (Lea Seydoux), Deadman (Guilhermo del Toro), Die-Hardman (Tommie Earl Jenkins), Mama (Margaret Qualley) e Heartman (Nicolas Winding Refn). Entretanto, meu destaque principal vai para o fantástico Cliff, vivido pelo surreal Mads Mikkelsen, e sem contar, é claro, do nosso vindouro companheiro super carismático, o BB, que embora não tenha falas, é um ponto chave para o título. Por mais que esse pequeno resumo de Death Stranding pareça, e de fato seja muito superficial, é complicado falar dessa obra em um espaço limitado como um texto, e também, assim como o estonteante longa-metragem do sul-coreano Bong Joon-ho, Parasita, quanto menos você souber da história, mais particular e subjetiva será a sua experiência. Aliás, subjetividade parece ser uma das palavras-chave para decifrar o game. O cerne de “DS” é não ser uma jogatina para amantes de first person shooters frenéticos, ou uma fantasia medieval com monstros mitológicos, mas sim uma aposta contemplativa e crítica de um mundo devastado. Por mais que muitas desenvolvedoras não declarem abertamente que seus jogos são completamente ligados a pautas políticas, Death Stranding não tem vergonha de se mostrar como uma grande metáfora para as decisões socioeconômicas e humanitárias do presidente estadunidense Donald Trump. Reconstruir a América é uma grande antítese para o slogan de “fazer a América grande novamente”, assim como retrata o passado colonialista dos Estados Unidos com o movimento da marcha para o oeste e a expansão de uma nação em meio ao desconhecido. Ademais, Death Stranding é um paralelo perfeito para os tempos sombrios de pandemia. Diferentemente do espectro ficcional do video-game, não tememos seres fantasmagóricos, mas sim uma ameaça patológica, nem mesmo lutamos contra terroristas que invocam fenômenos inexplicáveis, mas sim contra a desinformação e o negacionismo. Realizamos entregas de materiais de outro mundo a pessoas territorialmente isoladas em cidades, da mesma forma que os entregadores de comida fornecem alimentos para uma população indefesa e com medo, trancada em suas casas na vida real. Os contrapontos com a realidade de 2020 são tão surpreendentes e precisos, que fazem dessa jornada algo, como dito anteriormente, único. Death Stranding não é apenas sobre entregar cargas por terrenos íngrimes, e sim sobre unir novamente um povo. É criar nós e laços por pequenos gestos. Mesmo separados, ainda usamos redes para nos comunicar e estabelecer pontes. Mesmo nas eras mais complicadas e sombrias de nossa história, permanecemos juntos, e ao mesmo tempo, muito distantes.
Um jogo ambicioso
E é exatamente nesse contexto, que Hideo Kojima atingiu um grande marco para o seu game. Por mais que Death Stranding não possua um modelo de jogo multiplayer convencional, ele aprimora a maneira de como interagimos com outros jogadores. Durante nossa aventura, é muito normal encontrarmos escadas, caixas postais e cordas à nossa disposição para o uso. E se você pensa que isso foi fruto do próprio game, está enganado. Outros jogadores deixaram aqueles recursos propositalmente para você usufruir, em troca de curtidas. A cada criação de outro jogador encontrada, você tem a opção de curtir o gesto de seu colega, e consequentemente, lhe ajudar mutuamente. Além de deixar itens e ajudá-lo também. Por mais que games como Dark Souls já tenham essa mecânica implementada, Death Stranding a leva para um nível de necessidade. Em muitas situações, e principalmente no início do jogo, só conseguimos acessar determinadas áreas com grande facilidade devido às interações de outros players em suas jogatinas. E como eu já havia dito, a premissa do jogo base é realizar entregas, ou seja, selecionamos determinadas cargas e partimos do ponto A ao ponto B com algum objetivo. Seja missão principal ou secundária, essa base não muda muito. Entretanto, por mais simples que bancar o entregador de pizza possa parecer, nossa tarefa se torna árdua, não somente pelos inimigos que nos rodeiam, mas principalmente pelo mapa e nossas limitações. Em termos de gameplay, Death Stranding cumpre bem o seu papel. Não é algo que me enche os olhos, mas também não é um fracasso, e se assemelha muito com o último game de Kojima, Metal Gear Solid V: The Phantom Pain. O termo que melhor descreve o nosso “Correios Simulator” – entre boas aspas- é a estratégia, do francês “stratégie”. Sam precisa equilibrar milimetricamente suas encomendas no início do game; não temos recursos suficientes e o menor deslize ao subir uma montanha pode se transformar em uma carga perdida e muita dor de cabeça, e claro, isso sem contar os nossos adversários. Imagine-se com 70 quilos nas costas fugindo de uma força sobrenatural e uma música intensa em seus ouvidos. A preparação antes de cada missão é uma peça fundamental para a evolução em Death Stranding. Selecione cuidadosamente se vai carregar uma escada, ou outro equipamento, não fique sobrecarregado, mas também não leve itens a menos. Conforme a experiência avança, e acredite, isso vai levar boas horas, conseguiremos acesso a veículos, como motos e tratores. Só que as vezes essa pode não ser sua melhor opção, já que eles consomem muita energia e também nem sempre são a garantia para acessar todo e qualquer local, como um terreno rochoso.
Tinha uma pedra no meio do caminho
É claro que os nossos inimigos — ah, os inimigos — também serão uma boa pedra no sapato de Sam. E nesse momento eu estou falando quase que exclusivamente das EPs, as criaturas que nos aterrorizam por boa parte da jogatina. Elas serão responsáveis por muitas frustrações e momentos de desespero. Por outro lado, também existem as MULAs, ou seja, entregadores corrompidos que querem roubar sua carga, e os terroristas, que simplesmente querem a sua morte. Entretanto, esses dois últimos não são passíveis de boas comparações, uma vez que a inteligência artificial de Death Stranding parece se preocupar mais com os seres de outro plano. Além do mais, enfrentar seus inimigos exige cautela. Death Stranding não é o jogo que vai te dar uma metralhadora nos primeiros trinta minutos, e possivelmente você só conseguirá equipar uma boa arma depois de horas de gameplay. As vezes nem mesmo o stealth é o suficiente para enfrentar os seus problemas, e a melhor alternativa é fugir. Curiosamente, assim como toda boa história de apocalipse na terra, geralmente as criaturas que cercam o enredo são uma metáfora. Em The Last of Us: Part II os infectados não são o nosso maior problema, e assim como em Death Stranding, as EPs, que embora sejam os grandes adversários do jogador, teoricamente cumprem uma função natural para o enredo da obra, e o ser humano, dotado de malícia e ganância, prefere se autodestruir atacando aos de sua mesma espécie, do que a união e cooperação.
Um mundo bonito, e vazio
Por mais que o combate e o gameplay pesado não sejam grande parte do foco do game, o seu mundo aberto possui uma função importante e um tanto quanto contraditória. É muito compreensível, depois de citar todos os aspectos anteriores, que seja uma tarefa exaustiva fazer dezenas de entregas em um mapa relativamente grande. Elaborar estratégias certeiras não é fácil, tampouco sobreviver a esse mundo. A intenção de Death Stranding é transformar esse mesmo espaço geográfico em uma adversidade natural, e o jogo faz isso com coragem. Cenários com neve, relevos acidentados, rochosos e íngrimes transformam aquele universo em um desafio, mas ao mesmo tempo, fazem de nossa jornada uma experiência travada e extremamente tediosa. De nada adianta um mundo grande, bonito e vazio, sem muitas interações, mesmo que esse seja o escopo em que ele foi concebido. E aqui está o maior erro de Death Stranding na minha opinião. Mesmo ele nunca tendo sido vendido como uma experiência “normal”, sua sede de revolução faz com que o game queira dar um passo maior do que a própria perna. O título é fruto de um ritmo lento, monótono e por muitas vezes chato. Ao longo de seus 15 capítulos, que podem ter menos de uma hora a até 10 horas de duração, fazer repetidas entregas é extenuante e muito cansativo. Esse mesmo mundo é visualmente muito bonito, e remete a belas paisagens da Islândia. No PlayStation 4 conseguimos uma boa qualidade gráfica com um hardware de certa forma mais limitado. Agora, nos PCs as coisas são diferentes. Desenvolvido na belíssima Decima, mesmo motor gráfico de Horizon: Zero Dawn e cedido ao Kojima pela própria Guerrilla, Death Stranding foi um tanto quanto decepcionante para mim no que diz respeito a opções gráficas. Infelizmente não temos muitas opções de configurações de vídeo e isso dificulta muita a vida de uma parcela de jogadores que possuem máquinas mais modestas. Tecnicamente, Death Stranding tem uma otimização boa para o que suas especificações técnicas exigem:
Requisitos mínimos
CPU: Intel Core i5-3470 ou AMD Ryzen 3 1200RAM: 8GBHDD: 80GBGPU: AMD Radeon RX 560 4GB ou NVIDIA GeForce GTX 1050 3GBOS: Windows 7 64 bitDirectX: 12Resolução de tela 720p
Requisitos recomendados
CPU: Intel Core i7 3770 ou AMD Ryzen 5 1600RAM: 8GBHDD: 80GBGPU: AMD Radeon RX 590 ou NVIDIA GeForce GTX 1060 6GBOS: Windows 10DirectX: 12Resolução de tela 720p
É importante frisar que em nossos testes foi muito difícil rodar Death Stranding com apenas 8GB de memória RAM. Por mais que os requisitos informem que é possível rodá-lo de maneira fluída, sua experiência poderá ser marcada por eventuais travadas e uma performance ruim. Isso não chega a ser um problema do ponto de vista evolutivo, já que muitos jogos já estão começando a adotar 16GB de RAM em suas especificações, mas a crítica aqui é isso não ter sido bem evidenciado pelas recomendações do estúdio. Em contrapartida, a NVIDIA soube como trabalhar com esse jogo. Sua mais famosa tecnologia, o Ray Tracing, que melhora significantemente a qualidade de iluminação dos games não é o chamariz da vez, mas sim o DSLL 2.0. O Deep Learning Super Sampling é uma inteligência artificial que atua de maneira conjunta com o Ray Tracing e está disponível apenas para as placas de vídeo GeForce RTX. Mas o que essa tecnologia realmente faz? A grosso modo, ela melhora a qualidade gráfica de seus jogos e ainda sobe a taxa de quadros por segundos. Mesmo que no papel isso seja interessante, na prática, e principalmente em Death Stranding é algo incrível. Para termos de comparação, se pegarmos a mais básica placa da linha RTX da NVIDIA, a RTX 2060, e um processador intermediário como o Intel Core i5, rodando em 1080p é possível conseguir um desempenho na casa de 100 quadros, e ao ativar o DSLL 2.0, há o ganho de pelo menos 20 frames por segundo. Por mais que essa placa já dê conta do game com folga, é interessante testar resolução mais altas, como o 1440p e o 4K. Portanto, a nossa recomendação é rodar esse game em placas da NVIDIA. A soma de boas tecnologias e a otimização do título fazem com que ele rode muito bem inclusive em placas do segmento de entrada, como a GTX 1650, que possui review no Showmetech. Deixando os aspectos técnicos de lado, Hideo Kojima sempre foi um amante de um bom entretenimento. De obras vanguardistas como Blade Runner a reimaginações de filmes transformados em séries, como Hannibal, o diretor também tem o dedo certeiro para escolher músicas, e a trilha sonora de Death Stranding é o alicerce que dá tons coloridos a uma pintura um tanto quanto preta e branca. Mesmo que eu tenha dito que as entregas ao longo de um mapa vazio sejam monótonas — e reitero que são — essas tarefas ficam muito melhores com o acompanhamento magistral de uma trilha sonora competente e forte, que inclusive estou escutando enquanto escrevo esse texto. Sem contar as músicas tema de missões e personagens, o destaque principal vai para os projetos de terceiros, principalmente para a banda islandesa Low Roar, que esteve presente no primeiro trailer de Death Stranding com “I’ll keep coming”. Além disso, The Neighbourhood, Bring Me The Horizon, Khalid e Major Lazer completam esse game com ótimas faixas. E o principal impacto dessa trilha sonora cativante, é passar horas e horas isolado em um mapa e ser contemplado com algo além da sonoridade do ambiente. Ao ficarmos na pele do Sam por mais de 30 horas, sentimentos sua solidão, sua angústia, e seu medo camuflado.
O que é Death Stranding?
Antes de responder essa pergunta, e enquanto eu raciocinava a respeito do fim do game, eu também me questionava o que torna um game bom ou ruim. Serão os gráficos? A história? Jogabilidade? Ou a trilha sonora? Death Stranding está longe de ser um jogo ruim. Ele é fruto das ambições e anseios de seu criador, e por conta disso é uma obra que tenta ser tão revolucionária hoje, mas é apenas uma experiência fora da caixa. Death Stranding é a síntese de um jogo tão ambicioso, que parece não saber o que quer. A história impecável e fantástica é o seu ponto alto, porém, só engrena nas últimas horas, e isso faz com que todo o processo para chegar até ela seja falho. A jogabilidade cumpre sua função, enquanto a direção de arte e trilha sonora é um esplendor à parte. Pode ser clichê dizer isso, mas Death Stranding não é uma obra para agradar a todos. No entanto, assim como as teses do pensador inglês John Locke, a respeito da definição prática do empirismo, o conhecimento advém apenas da experiência prática, logo, Death Stranding pode apenas ser decifrado de acordo com a sua própria jornada, seus próprios relatos e descobertas com aquele universo e aqueles personagens. Você encontra Death Stranding para PC por R$ 239 na Steam e na Epic Store. Para sua experiência com o jogo ser completa, confira também nossa seleção de placas NVIDIA GeForce:
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Para conferir mais reviews como esse, fique ligado no Showmetech.